Não sou nenhum
especialista em carnaval. Olho para ele como um fenômeno social que envolve as
massas sem muito critério de avaliação. Nunca fui a um desfile e muito menos a
festas carnavalescas nos salões da cidade. Escrevo como um observador, alguém
que vê a realidade e reflete sobre ela sem estar inserido nela. Não faço uma
análise imanente por estar fora da realidade analisada. Não analiso para julgar
se o fenômeno é certo ou errado, se é de Deus ou do Diabo. Não é essa a minha
motivação. Apenas levanto vias de observação para uma melhor compreensão das
coisas que acontecem.
Quando observo o carnaval,
vejo dois lados que se entrelaçam: o bonito e o feio. Creio que neste caso o
belo sufoca o feio. A beleza do carnaval entorpece a mente humana escondendo um
lado feio que inconscientemente vai deformando o mesmo ser que do belo se
entorpece. A beleza muitas vezes cega!
Percebo algumas coisas
que são bonitas no carnaval. O mais evidente é a beleza dos desfiles que é a
glória desta festa. A passarela do samba é o céu dos carnavalescos. É na
passarela que eles desfrutam da alegria que esperaram durante todo um ano.
Vejo uma beleza singular no espírito de equipe que há nas escolas de samba;
todos trabalham com um único objetivo em mente. Esse espírito de equipe pode ser visto na
construção dos carros alegóricos e fantasias nos barracões das escolas, na
harmonia dos blocos, nas coreografias e baterias. No desfile de carnaval não há
espaço para artistas individuais. A beleza da arte vem do grupo. Posso
contemplar também a beleza da criatividade no uso de materiais recicláveis nas
alegorias, na força do voluntariado no trabalho de preparação, nos temas
tratados e no respeito aos líderes de bateria. Gosto de ver a motivação das
pessoas diante da possibilidade de desfilar ou até deslizar na passarela do samba.
Há certa beleza em tudo isso...
Apesar de toda beleza o
carnaval apresenta também um lado sombrio. Vemos, por exemplo, a exploração do
corpo seminu. Homens e mulheres criam fantasias mentais em uma multidão ávida
pela luxuria. Nos desfiles e nas festas carnavalescas o corpo se transforma no
centro das atenções; a carne é exaltada e o espírito esquecido. A festa
carnavalesca mexe na libido potencializando o extravasar de uma sexualidade sem
compromisso e cuidado. A exposição do corpo acende o fogo na passarela... Vejo
um lado feio também na hipocrisia da união de classes onde ricos e pobres, que
não conseguem conviver juntos no dia-a-dia, deslizam na passarela como se
fossem parceiros na trama da existência. Enquanto uns deixam de comer para ter
as suas fantasias, outros desfilam em pura ostentação. Observo também que a
alegria do carnaval é espasmódica e não perene. A euforia da festa não apaga a
dor que cada um carrega; narcotiza, mas não elimina. Isso a mídia não mostra!
Quando olhamos para um
fato, precisamos ampliar o nosso olhar. Ver só o que está diante dos olhos não
conscientiza, robotiza. Olhar para o carnaval só pelo lado do belo, limita a
nossa compreensão do mundo fantasioso que envolve o fenômeno chamado carnaval.
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